Comunidades pedem acesso direto a verbas de financiamento climático na COP30

A presença maciça de organizações da sociedade civil na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém, colocou no centro das discussões a demanda de povos indígenas, afrodescendentes, ribeirinhos e demais comunidades tradicionais por acesso direto ao financiamento climático.

Esses grupos argumentam que, apesar de viverem em ecossistemas que desempenham papel crucial no sequestro de carbono, recebem apenas uma fração dos recursos internacionais destinados à ação climática. Segundo a vice-presidente sênior para a América do Sul da Conservation International, Raquel Biderman, “apenas 3% das finanças climáticas globais chegam à natureza, e as comunidades ficam com 1% desse montante”. Para ela, o volume é “ínfimo” diante do fato de que soluções baseadas na natureza respondem por cerca de 30% do potencial de mitigação do aquecimento global.

O tema ganhou destaque após manifestações que questionaram a baixa representatividade dessas populações nas negociações oficiais. Um protesto chegou a tentar atravessar o bloqueio de segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) na capital paraense, sinalizando a insatisfação com o modelo vigente, considerado excessivamente intermediado por instituições financeiras e governos.

O pedido é respaldado por números. O Brasil abriga 1,7 milhão de indígenas, conforme o Censo 2022, distribuídos em 511 povos na Amazônia, dos quais 391 vivem em território brasileiro. A atuação histórica dessas comunidades no manejo sustentável da floresta ajuda a preservar extensos estoques de carbono, contribuindo para evitar que a temperatura média global ultrapasse 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais — meta central do Acordo de Paris.

Estudos citados por Biderman indicam que seriam necessários US$ 7 bilhões anuais apenas para conservar a Amazônia, mas o investimento atual gira em torno de US$ 600 milhões. A lacuna de financiamento alimenta a pressão por mecanismos que cheguem “da fonte ao destino” sem intermediários onerosos.

Na COP30, iniciativas como o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (Tropical Forests Forever Fund) apareceram como possíveis soluções. Elas se somam a instrumentos já conhecidos, a exemplo da conversão de dívida por natureza, fundos de conservação, mercado de carbono voluntário e negócios de bioeconomia. Para a executiva da Conservation International, o avanço dessas modalidades requer “uma sociedade atenta aos contratos e à qualidade dos projetos”.

A expectativa é que o acesso direto a recursos fortaleça cadeias produtivas sustentáveis — do ecoturismo ao manejo agroflorestal — e ofereça alternativas econômicas frente ao avanço de atividades ilegais vinculadas a tráfico de drogas, armas e garimpo. Biderman lembra que mais de 100 cadeias de produtos amazônicos poderiam gerar renda sem comprometer os modos de vida tradicionais, reduzindo também o risco de aliciamento de jovens por organizações criminosas.

Historicamente, políticas públicas destinadas a povos tradicionais foram marcadas por descontinuidade. A diversificação de fontes de financiamento climático surge como estratégia para conferir estabilidade aos programas de conservação e de geração de renda nos territórios. Especialistas apontam que, para funcionar, o modelo deve combinar apoio governamental, capital privado e participação ativa das próprias comunidades — princípio que orienta a reivindicação por maior autonomia no uso dos recursos.

Enquanto países devedores do clima anunciam novos compromissos financeiros, líderes de povos tradicionais alertam que a distância entre promessas e desembolsos efetivos permanece ampla. O debate deve continuar nas próximas rodadas de negociação, com foco em estruturar mecanismos transparentes que permitam a entrega rápida e sustentável das verbas a quem mantém a floresta em pé.

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