
A morte de 121 pessoas durante a Operação Contenção, realizada pela Polícia Militar do Rio de Janeiro em 28 de outubro nos complexos da Penha e do Alemão, colocou a segurança pública no centro da agenda política nacional. Nos dias seguintes, o governo federal enviou ao Congresso um Projeto de Lei que endurece penas para líderes e integrantes de facções criminosas.
O texto, conhecido como PL Antifacção, já recebeu cinco versões na Câmara. A quinta foi apresentada nesta terça-feira (18) pelo relator, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), após negociações com base governista e oposição. Paralelamente, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 18, enviada em abril pelo Executivo, redefine competências de União, estados e municípios na área e também aguarda votação.
Especialistas veem nas duas iniciativas potencial para mobilizar o eleitorado de 2026. O cientista social Mauro Paulino observa que “as pesquisas recentes mostram a segurança superando economia e saúde entre as maiores preocupações do brasileiro”. Para ele, a presença cada vez mais visível de facções como PCC e Comando Vermelho, além das milícias, aproximou o tema do cotidiano da população, em especial a de menor renda.
O apoio expressivo à operação fluminense, medido por diferentes institutos, reflete, segundo o estatístico Marcelo Souza, do Instituto MDA, “uma tendência de aceitação de respostas mais punitivas contra o crime”. Na avaliação dele, ações com grande exposição midiática reforçam a percepção de que o Estado está “combatendo o bandido”.
A repercussão positiva contrasta com a reação pública ao massacre do Carandiru, em 1992, quando 111 detentos foram mortos pela PM paulista. Paulino atribui a mudança ao “medo crescente” e à sensação de violência próxima. Esse sentimento, afirma, tem ampliado o respaldo a operações de grande impacto, sobretudo nas redes sociais.
Para a cientista política Walkiria Zambrzycki, pesquisadora do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG, operações como a Contenção não resolvem o problema. O país possui, segundo o Conselho Nacional de Justiça, a terceira maior população carcerária do mundo, com mais de 670 mil detentos – 94,5% homens, 70% negros e 54,8% sem ensino fundamental completo. “Prendemos mal, prendemos muito, e parte da sociedade ainda vê encarceramento ou morte de suspeitos como solução”, afirma.
Ela ressalta que a atuação policial difere conforme o território: “Nas favelas, a abordagem envolve recorte racial, social e econômico”. A pesquisadora questiona se essas táticas aumentam de fato a sensação de segurança ou apenas geram novos riscos para moradores e policiais.
Análises de opinião pública mostram ainda que o respaldo à Operação Contenção varia por sexo, idade, escolaridade e posição ideológica. O consultor em dados Orjan Olsen nota maior aprovação entre homens e eleitores de direita, enquanto mulheres e grupos progressistas tendem a reprovar a ação. Esse cenário, diz ele, evidencia a polarização que extrapola disputas eleitorais e alcança o desenho de políticas públicas.
No campo da comunicação, o presidente do Instituto Locomotiva, Renato Meirelles, alerta para a desinformação sobre o episódio. Segundo ele, a mensagem que domina o debate é a de que “a polícia matou bandidos”, sem questionamento sobre devido processo legal ou eventuais vítimas inocentes. Meirelles sustenta que a população quer ver a violência controlada, mas poderia responder de forma distinta caso recebesse informações completas sobre procedimentos judiciais.
Com o avanço do PL Antifacção e da PEC da Segurança Pública, parlamentares devem intensificar discussões nas próximas semanas. Para observadores, o desfecho dessas propostas poderá redefinir estratégias eleitorais de 2026 e indicar que modelo de combate ao crime ganhará força no país.

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