
O promotor Lincoln Gakiya, do Ministério Público de São Paulo, afirmou nesta terça-feira (25) à Comissão Parlamentar de Inquérito do Crime Organizado, no Senado, que a ausência de coordenação entre as forças de segurança é o principal obstáculo para enfrentar facções como o Primeiro Comando da Capital (PCC).
Segundo o integrante do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), disputas institucionais entre polícias estaduais, Polícia Federal e Ministério Público, somadas à polarização política entre governos, impedem ações conjuntas. “Nestes 34 anos de carreira, nunca vi um modelo que garanta atuação coordenada, integrada e cooperativa”, disse.
Gakiya, que vive sob escolta após ser jurado de morte pelo PCC, alertou que o País corre o risco de transformar-se em narcoestado. Para ele, as facções já se infiltraram na economia formal, utilizando fintechs, casas de apostas on-line e criptomoedas — setores com regulação ainda limitada — para lavar dinheiro e ocultar patrimônio.
Como exemplo de cooperação pontual, o promotor citou a Operação Carbono Oculto, da Polícia Federal, que desarticulou esquemas de lavagem de dinheiro em São Paulo. Ele ponderou, entretanto, que a ação ocorreu “muito mais pela iniciativa de servidores do que por uma estratégia institucional entre chefias de diferentes esferas”.
Gakiya propôs a criação de uma Autoridade Nacional de Combate ao Crime Organizado, com representação de todas as polícias e órgãos de Estado, para estabelecer uma política permanente de segurança pública. Na visão do promotor, a Polícia Federal não deveria liderar sozinha essa estrutura para evitar resistência dos estados.
O promotor também criticou pontos do Projeto de Lei Antifacção, já aprovado na Câmara. Ele avalia que o texto não distingue com clareza líderes e executores das organizações criminosas e deveria prever instrumentos processuais mais rigorosos contra grupos de caráter mafioso. Além disso, questionou a retirada dos homicídios praticados por faccionados do Tribunal do Júri, mudança que, ao seu ver, “substitui a possível pressão sobre jurados por igual pressão sobre juízes”.
Durante a CPI, Gakiya apresentou dados que mostram a expansão do PCC: de receita estimada em R$ 10 milhões anuais em 2010 para cerca de R$ 10 bilhões atualmente, presença em todas as unidades da Federação e atuação em pelo menos 28 países. Ele mencionou ainda empresas de ônibus que transportavam 25 milhões de passageiros por mês na capital paulista e faturavam mais de R$ 1 bilhão por ano em subsídios municipais, com integrantes da facção entre acionistas e diretores.
O promotor ressaltou a necessidade de aperfeiçoar a fiscalização financeira. Segundo ele, até a Operação Carbono Oculto, o Banco Central não supervisionava fintechs e o Coaf não recebia informações dessas empresas. “Percebemos deficiência de regulamentação e de fiscalização que facilita a lavagem de dinheiro”, concluiu.

Faça um comentário