Mostra no Museu do Ipiranga em São Paulo revisita Debret e inspira releituras

O Museu do Ipiranga, em São Paulo, abriu nesta terça-feira (25) a exposição “Debret em questão – olhares contemporâneos”, que aproxima a produção do francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848) de trabalhos recentes de 20 artistas brasileiros. A mostra reúne 35 litografias do livro Voyage pittoresque et historique au Brésil, publicado em Paris entre 1834 e 1839, e obras inéditas de Rosana Paulino e Jaime Lauriano.

A iniciativa deriva do livro Rever Debret (Editora 34, 2023), do pesquisador Jacques Leenhardt, curador da exposição ao lado de Gabriela Longman. Organizada em duas partes, a montagem apresenta primeiro os painéis originais do período imperial e, em seguida, intervenções contemporâneas que contestam versões oficiais da história e apontam permanências da escravidão na sociedade brasileira.

Entre 1816 e 1831, Debret documentou o cotidiano do Rio de Janeiro, então capital do Império, com atenção minuciosa às relações de trabalho. “O escravo é figura central; quem constrói o país são eles”, observou Leenhardt. Essa perspectiva levou à rejeição da série pelo governo imperial, que considerou excessiva a denúncia da violência contra pessoas escravizadas.

Na ala dedicada às releituras, o público encontra fotografia, vídeo, instalação, gravura, pintura e colagem digital. “A variedade de suportes reflete a pluralidade da arte contemporânea”, explicou Longman. Entre os participantes estão Gê Viana, Dalton Paula, Isabel Löfgren & Patricia Goùvea, Denilson Baniwa, Anna Bella Geiger, Sandra Gamarra e Tiago SantAna.

Rosana Paulino exibe Paraíso Tropical, obra que revisita a antiga idealização do Brasil como lugar idílico para revelar a exploração de suas riquezas naturais. Jaime Lauriano apresenta a instalação Brasil através do espelho e a série fotográfica Justiça e Barbárie, que utiliza títulos de Debret para relacionar cenas históricas e episódios recentes de violência, incluindo registros de linchamentos divulgados pela imprensa.

Para o diretor do museu, Paulo Garcez Marins, as mostras temporárias buscam ler o passado a partir de questões atuais. “É uma operação histórica que evidencia formas de violência e resistência que moldaram o país”, afirmou.

Os primeiros painéis da exposição tratam da dominação sobre povos indígenas. Em seguida, cenas registram diversos ofícios exercidos por pessoas escravizadas — de barbeiros a artesãos — destacando a amplitude do trabalho forçado no Brasil do século XIX. “As imagens quebram clichês sobre trabalho apenas nas plantações”, acrescentou Longman.

Com o tempo, as litografias de Debret circularam em manuais escolares, calendários, camisetas e até na abertura da novela A Escrava Isaura (1976), muitas vezes desgarradas de seu contexto crítico. Segundo Marins, a difusão descontextualizada reforçou visões nostálgicas do período escravista.

Além das obras visuais, uma sala exibe fotografias de Marcel Gautherot que registram o desfile da escola Acadêmicos do Salgueiro em 1959, inspirado no trabalho de Debret.

Serviço
A exposição fica em cartaz até 17 de maio de 2026
Horário: de terça a domingo, das 10h às 17h
Local: Museu do Ipiranga, zona sul da capital paulista.

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