
Levantamento conduzido pelo Instituto Rede Abrigo, em parceria com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), indica que crianças e adolescentes acolhidos em 129 dos 155 abrigos e casas-lares do Rio de Janeiro convivem com infraestrutura deficiente, falta de itens básicos e escassez de atendimento especializado. Os resultados do estudo serão apresentados em 26 de agosto e abrangem informações de 1.156 jovens, o equivalente a mais de 80% da população acolhida no estado.
Entre as unidades visitadas, 83,72% funcionam como abrigos institucionais e 16,28% adotam o modelo de casa-lar. A gestão é majoritariamente municipal (75,97%) e 84,50% dos locais recebem meninos e meninas. Apenas 53,49% atendem de forma integral a faixa etária de 0 a 18 anos, contrariando diretriz do Conselho Nacional de Assistência Social e ocasionando, por exemplo, a separação de irmãos com idades distintas.
Superlotação e problemas estruturais
Nove instituições ultrapassam o limite legal de 20 vagas, chegando a 25 acolhidos, enquanto outras 12 operam em situação de superlotação com mais de 30 crianças ou adolescentes. Deficiências de infraestrutura foram relatadas por 53,49% dos locais, destacando-se móveis danificados (41,86%), mofo e infiltrações (37,98%), falhas em telefonia e internet (37,98%), além de problemas elétricos (34,11%) e em paredes (34,11%).
Itens de higiene pessoal são compartilhados em 18,60% dos abrigos; roupas e agasalhos, em 10,08%; calçados, em 7,75%. Mais de um terço das unidades (32,56%) enfrenta dificuldade para fornecer roupas íntimas adequadas.
Perfil dos acolhidos e acesso a serviços
Crianças e adolescentes negros representam 78,29% dos acolhidos, 62,72% são oriundos de favelas ou periferias urbanas e 52,42% têm origem em famílias monoparentais femininas. A faixa etária de 12 a 17 anos é predominante, correspondendo a 44,81% do total.
Antes do acolhimento, 84,43% sofreram algum tipo de violência; 63,49% vivenciaram dois ou mais tipos. A violência psicológica é a mais recorrente (72,49%), seguida pela violência sexual, que atinge 21,97% do grupo. Apesar desse histórico, apenas 44,40% recebem acompanhamento psicológico e 51,61% realizam tratamentos de saúde. Exames de vista nunca foram feitos por 51,30% dos jovens, e 26,36% dos abrigos relatam dificuldade para obter medicamentos.
Defasagem escolar e capacitação de equipes
No campo educacional, 47,06% apresentam atraso escolar e 27,51% das crianças em idade de alfabetização ainda não sabem ler ou escrever. Paralelamente, 28,68% das instituições não oferecem qualquer capacitação aos funcionários, e 67,44% dos gestores apontam a ausência de formação contínua como o principal obstáculo.
Para os pesquisadores, “a predominância do modelo institucionalizado, associada à falta de recursos e à fragilidade da infraestrutura, compromete o princípio da proteção integral previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente”. O estudo conclui que o acolhimento, concebido como medida temporária, acaba se tornando “espaço de reprodução de desigualdades” quando não há políticas públicas articuladas.

Imagem: Rede Abrigo
Diante desse cenário, o relatório recomenda revisão das práticas institucionais, reforço da rede de proteção e investimentos contínuos em infraestrutura, saúde, educação e formação de profissionais, a fim de garantir direitos previstos em legislação federal.
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