
Cerca de mil crianças do Alto Xingu, no Mato Grosso, começam a receber exemplares de Ingu Helü (De Olho Aberto), primeiro livro infantil em kuikuro já produzido para a região. A obra será distribuída em nove aldeias frequentadas pelos povos Kuikuro, Kalapalo, Matipu e Nahukwá, todos falantes do idioma pertencente ao tronco karib.
O projeto foi desenvolvido pelo educador Daniel Massa e pelo professor indígena Mutuá Mehinaku, com ilustrações de Ricardo Moura. O volume reúne 45 verbetes escritos em kuikuro acompanhados da tradução para o português e de desenhos para colorir, recurso pensado para apoiar a alfabetização bilíngue.
Mehinaku, que leciona há mais de duas décadas na escola estadual da aldeia Ipatse, relata que a escassez de material específico motivou a iniciativa. “Os livros que chegavam tinham qualidade, mas não dialogavam com a realidade da nossa comunidade; precisávamos de uma cartilha própria”, afirmou o professor durante o lançamento.
A estreia pública de Ingu Helü ocorreu em 20 de novembro, na Feira Literária Internacional de Saquarema (FLIS), no Rio de Janeiro, durante o painel “A Educação para a Diversidade nas Escolas Indígenas e Não-indígenas”. Além dos autores, o debate reuniu nomes da literatura indígena contemporânea, como Eliane Potiguara e Márcia Kambeba.
Localizado entre o Cerrado e a Amazônia, o Território Indígena do Xingu abriga 16 povos e quatro grupos linguísticos, somando mais de seis mil habitantes. O kuikuro integra o tronco karib, que reúne cerca de 40 línguas faladas por 60 a 100 mil pessoas em diferentes países amazônicos.
Segundo Daniel Massa, exemplares adicionais serão encaminhados a bibliotecas públicas de cidades próximas e a escolas urbanas interessadas em incorporar conteúdos sobre culturas originárias. Para ele, o livro pode “abrir os olhos de estudantes não indígenas para a diversidade linguística do país”.
A distribuição nos municípios vizinhos está programada para ocorrer até o fim do ano letivo. Já nas aldeias do Alto Xingu, o material passa a ser utilizado imediatamente nas aulas de língua materna, reforçando a preservação do kuikuro e ampliando o acesso das crianças à leitura em sua primeira língua.

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