
Quilombolas de diversas regiões do estado do Rio de Janeiro reuniram-se no sábado, 15 de novembro, na capital fluminense, para a Cúpula das Vozes Quilombolas pelo Clima e denunciaram a morosidade do processo de titulação de terras quilombolas. Segundo a Associação das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro (Acquilerj), apenas três dos 54 territórios reconhecidos possuem títulos de posse: Marambaia, em Mangaratiba; Preto Forro, em Cabo Frio; e Campinho, em Paraty.
A presidenta da Acquilerj, Bia Nunes, afirmou que dois desses títulos apresentam pendências jurídicas que necessitam de revisão e criticou a prática de condicionantes para que os processos avancem. “Há uma chantagem emocional quando nos pedem para abrir mão de grandes áreas para receber o documento”, declarou.
A mesa de abertura, intitulada “Vozes Quilombolas”, reuniu representantes de 16 territórios que apresentaram demandas e estratégias de resistência. O objetivo, explicou Bia, foi garantir que os próprios quilombolas conduzissem o debate sobre seus direitos territoriais e climáticos.
Dificuldades no litoral de Cabo Frio
Alessandra Rangel Oliveira, responsável pelas questões ambientais da Acquilerj e moradora do quilombo Maria Joaquina, relatou que Cabo Frio abriga sete comunidades certificadas pela Fundação Palmares, mas somente a de Preto Forro possui a titulação definitiva. A cidade é marcada por intensa especulação imobiliária, o que gera conflitos com grileiros, fazendeiros e loteamentos.
Segundo Alessandra, a sobreposição de áreas reivindicadas por quilombolas e proprietários rurais desencadeia ameaças. “Quando denunciamos impactos ambientais, lideranças recebem intimidações e correm risco de vida”, disse. Ela acrescentou que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) iniciou negociações para a primeira fase de titulação em três comunidades, porém o receio de represálias fez parte das lideranças recuar.
Outro obstáculo é a necessidade de indenização dos proprietários das fazendas afetadas. De acordo com Alessandra, o governo estadual alega falta de recursos para concluir o pagamento, o que paralisa os processos.

Participação restrita em fóruns climáticos
Durante o encontro, Alessandra avaliou como limitada a participação dos quilombolas na preparação da COP 30, prevista para 2026 em Belém. Ela lembrou que a delegação teve apenas quatro credenciais concedidas pelo governo, o que dificultou a inserção das comunidades nas discussões decisórias.
Reconhecimento dentro do Parque Nacional da Tijuca
Representante do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e gestora do Parque Nacional da Tijuca, Viviane Lasmar Pacheco informou que a comunidade quilombola Pedra Bonita, situada dentro da unidade de conservação, recebeu certificação há três anos. Um termo de compromisso vem sendo elaborado para assegurar direitos territoriais e deveres de conservação até a emissão do título de propriedade. O território abriga entre 20 e 25 famílias.
A titulação de terras quilombolas é prevista pela Constituição de 1988 e regulamentada pelo Decreto 4.887/2003, mas, de acordo com a Acquilerj, a lentidão nos procedimentos administrativos coloca em risco a permanência das comunidades em seus territórios tradicionais e agrava conflitos agrários no estado.

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