Bancos analisam alcance de sanções da Lei Magnitsky a Alexandre de Moraes

Instituições financeiras brasileiras avaliam, de forma reservada, as implicações das sanções impostas ao ministro Alexandre de Moraes pelo governo dos Estados Unidos com base na Lei Magnitsky. O magistrado do Supremo Tribunal Federal (STF) foi incluído, em 2 de agosto, na lista de pessoas sancionadas pelo Office of Foreign Assets Control (Ofac), órgão do Departamento do Tesouro norte-americano. A inclusão prevê bloqueio de bens em território americano, proibição de transações com cidadãos ou empresas dos EUA e exclusão do sistema financeiro vinculado ao dólar.

A decisão provocou incerteza no mercado nacional porque a legislação norte-americana prevê sanções secundárias a instituições que mantenham relações comerciais ou financeiras com o alvo listado. Isso significa que bancos que processem pagamentos ou câmbio para Moraes podem, em tese, sofrer multas, congelamento de ativos nos Estados Unidos ou perda de acesso ao sistema bancário do país.

Consultas jurídicas em andamento

Executivos ouvidos reservadamente afirmam que cada banco está revisando contratos, políticas de compliance e rotinas de monitoramento. Ainda não há entendimento uniforme sobre até que ponto as exigências da Lei Magnitsky se aplicam a operações internas em reais ou a serviços como cartões internacionais.

O Itaú Unibanco limitou-se a dizer que “cumpre rigorosamente as legislações em todos os países em que atua” e que não comenta casos específicos, citando sigilo bancário. O Banco do Brasil, onde Moraes recebe salários como servidor público, adotou a mesma postura. O Bradesco não respondeu aos questionamentos, e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) preferiu não se manifestar.

Para um executivo do setor, cujo banco mantém filial em Nova York, “não há muito espaço para manobra”. Segundo ele, instituições com exposição nos EUA tendem a seguir as determinações do Ofac para evitar sanções secundárias que poderiam comprometer o acesso ao sistema de compensação em dólar.

Ambiguidade sobre operações domésticas

Parte dos especialistas interpreta que a nota do Tesouro norte-americano não impede que Moraes mantenha contas correntes nem utilize serviços em reais dentro do Brasil. A restrição principal recairia sobre quaisquer transações que passem pelo sistema financeiro dos EUA, o que inclui remessas internacionais, uso de cartões emitidos por bandeiras americanas e câmbio.

Outro grupo, porém, entende que a manutenção do relacionamento bancário, mesmo para operações internas, pode representar risco reputacional e jurídico. A eventual necessidade de encerrar contratos com o ministro é analisada caso a caso, dependendo da exposição da instituição ao mercado externo.

Risco de judicialização

O cenário de incerteza alimenta debates sobre eventuais ações judiciais. O advogado criminalista Berlinque Cantelmo, do RCA Advogados, avalia que Moraes pode questionar a aplicação automática de uma norma estrangeira por bancos brasileiros. No entanto, ele reconhece que “a dependência do sistema global baseado no dólar torna a contestação pouco eficaz na prática”.

Para o constitucionalista Guilherme Barcelos, do escritório Barcelos Alarcon, uma eventual decisão bancária de romper relações com Moraes sem respaldo de autoridade nacional poderia ser considerada inconstitucional. Ele menciona três caminhos possíveis: atuação diplomática do Itamaraty junto ao Departamento de Estado, processo administrativo diante do próprio governo americano ou contestação na Justiça dos EUA — embora, até hoje, nenhum afetado tenha obtido sucesso nesse último foro.

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Imagem: Google Imagem

Articulações políticas e diplomáticas

O ministro do STF defende reação política do governo brasileiro. Jantares e almoços com autoridades — entre eles um encontro oferecido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e reunião na residência do presidente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras, Rodrigo Maia — têm discutido estratégias para contornar os efeitos da Lei Magnitsky.

Paralelamente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro e o jornalista Paulo Figueiredo participam esta semana, em Washington, de reuniões com assessores da Casa Branca para solicitar que o Ofac esclareça a amplitude das sanções. Eles também pretendem defender a inclusão de outros magistrados na lista.

Pouca expectativa de reversão imediata

A constitucionalista Vera Chemim considera inevitável o cumprimento das restrições pelos bancos. Para ela, “é complexa a reversão no curto prazo” diante da gravidade das acusações formuladas pelo governo americano, que apontou censura e prisões abusivas de envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023. Ela avalia que a rigidez das medidas pode aumentar, dependendo da evolução do caso; há possibilidade de que familiares do ministro, como a esposa Viviane Barci, sejam incluídos futuramente.

A Lei Magnitsky, aprovada em 2016 ainda no governo de Barack Obama, autoriza o Executivo norte-americano a punir estrangeiros acusados de corrupção ou violações de direitos humanos sem necessidade de processo judicial. Por causa do peso do dólar nas finanças globais, as sanções costumam ser comparadas a uma “pena de morte financeira”, já que praticamente todas as transações de comércio exterior passam de algum modo pelo sistema bancário dos EUA.

Embora Alexandre de Moraes tenha afirmado não possuir bens nem investimentos nos Estados Unidos, fontes do mercado dizem que o risco não se limita ao patrimônio situado em território americano. Qualquer movimentação internacional que envolva correspondentes bancários dos EUA pode ser bloqueada automaticamente por mecanismos de verificação internos das instituições.

Diante da combinação de ineditismo, pressões regulatórias e forte dependência do sistema financeiro global, os bancos brasileiros seguem analisando os impactos concretos das sanções e as medidas necessárias para evitar conflito com Washington. Até que o governo brasileiro ou a Justiça norte-americana esclareçam o alcance real da Lei Magnitsky no caso, prevalece uma postura de cautela máxima nas diretorias de compliance.

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