STF assegura auxílio do INSS a trabalhadoras vítimas de violência

A maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deve pagar um benefício temporário, equivalente ao auxílio-doença, a seguradas que precisem se afastar do trabalho após sofrer violência doméstica.

O entendimento foi firmado no julgamento de um recurso em que o INSS contestava decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Naquele processo, uma trabalhadora do Paraná obteve o direito de receber prestação previdenciária durante o período de afastamento previsto na Lei 11.340/2006, a Lei Maria da Penha. A autarquia alegava ausência de previsão legal que a obrigasse a custear o pagamento.

Relator do caso, o ministro Flávio Dino votou para manter o benefício. Segundo ele, a legislação deve ser interpretada de forma a oferecer “a maior proteção possível à mulher vítima de violência doméstica e familiar”. O ministro afirmou ainda que a medida pode ser determinada pela Justiça estadual sempre que necessário para garantir a efetividade da proteção prevista na Lei Maria da Penha.

O voto de Dino foi acompanhado por Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Dias Toffoli, formando maioria no plenário virtual. Os demais ministros têm até as 23h59 desta segunda-feira (18) para registrar seus posicionamentos. Caso não haja pedido de vista ou de destaque, o julgamento será concluído com a confirmação do resultado.

Como ficará o pagamento

Pelo entendimento majoritário, o afastamento de até seis meses previsto no artigo 9º, inciso II, da Lei Maria da Penha deve ter garantia financeira imediata. Quando a mulher possuir vínculo empregatício, o valor será pago a título de benefício previdenciário, nos moldes do auxílio-doença. Para trabalhadoras informais, o suporte terá natureza assistencial, desde que fique comprovada a impossibilidade de exercer atividade profissional.

Além de assegurar a remuneração, a decisão determina a manutenção de todos os direitos trabalhistas durante o período de afastamento, inclusive recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), contribuições previdenciárias e contagem de tempo de serviço. “A vítima não pode ser duplamente penalizada por circunstâncias alheias à sua vontade”, escreveu o relator.

Ressarcimento futuro à Previdência

Outro ponto abordado pelos ministros trata do possível ressarcimento aos cofres da Previdência. A decisão estabelece que, depois de conceder o benefício, a União poderá acionar a Justiça Federal para que os valores pagos sejam recuperados de forma regressiva junto aos responsáveis pela violência. O mecanismo já é aplicado em outras situações, como acidentes de trânsito provocados por terceiros.

Para Flávio Dino, essa solução garante a efetividade imediata da proteção sem comprometer o equilíbrio financeiro da Previdência Social. O relator destacou que a Lei Maria da Penha não prevê qual ente deve arcar com o sustento da vítima durante o afastamento, o que levou juízes de primeira instância a determinarem o pagamento pelo INSS caso a trabalhadora seja segurada.

Argumentos do INSS

No recurso apresentado ao STF, o INSS sustentou que a Lei 8.213/1991, que rege os benefícios previdenciários, não inclui afastamento por violência doméstica entre as hipóteses de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. Por essa razão, a autarquia argumentou que não haveria base legal para obrigá-la a conceder o pagamento.

O entendimento da maioria dos ministros, contudo, é que a ausência de dispositivo específico não impede a aplicação de princípios constitucionais de proteção à mulher e de dignidade da pessoa humana. “Interpretar o sistema normativo de forma integrada é indispensável para garantir o acesso da vítima a condições mínimas de subsistência”, observou Dino.

Consequências práticas

Especialistas em Direito Previdenciário avaliam que a decisão pode uniformizar procedimentos judiciais em todo o país. Até agora, diferentes tribunais vinham adotando posicionamentos divergentes, ora transferindo o pagamento ao empregador, ora à Previdência ou, em alguns casos, não reconhecendo nenhum responsável. Com o precedente do STF, a situação tende a ser padronizada em favor das vítimas.

A decisão também repercute no combate à violência doméstica. Ao assegurar renda durante o afastamento, o tribunal pretende reduzir a dependência econômica que muitas vezes impede a mulher de se afastar do agressor. “Sem suporte financeiro, a medida protetiva ficava esvaziada”, afirmou em voto o ministro Alexandre de Moraes.

Além disso, o reconhecimento do benefício pode estimular a formalização de vínculos de trabalho, pois mulheres com carteira assinada terão garantia imediata de renda, enquanto trabalhadoras informais precisarão comprovar impossibilidade de exercer atividade remunerada para acessar o benefício assistencial.

Próximos passos

Encerrado o julgamento virtual, a ata será publicada e a decisão passará a orientar todos os juízos de primeira instância. Em seguida, casos semelhantes que tramitam na Justiça poderão ter desfecho mais rápido, adotando o entendimento firmado pela Suprema Corte.

Para o INSS, a medida exigirá ajustes operacionais, como a criação de códigos específicos para afastamento por violência doméstica e a preparação de equipes para análise de documentos expedidos pelos juizados de violência contra a mulher. O Ministério da Previdência Social ainda não divulgou previsão de regulamentação interna.

Enquanto isso, organizações de defesa dos direitos das mulheres comemoraram o resultado parcial. Em nota, entidades afirmaram que a decisão “fortalece a rede de proteção e garante condições para que vítimas possam romper o ciclo de agressão”.

O julgamento será oficialmente concluído após o fim do prazo para votos faltantes. Caso nenhum ministro peça mais tempo de análise, o entendimento de que o INSS deve pagar o benefício temporário às mulheres afastadas do trabalho por violência doméstica passará a ter efeito vinculante para todas as instâncias inferiores.

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