Ultraprocessados já representam 23% da dieta no Brasil, diz USP

Prateleira de alimentos ultraprocessados em supermercado, destaque para produtos como hambúrgueres e refeições instantâneas, ilustrando o consumo de 23% da dieta no Brasil, conforme pesquisa da USP.

O volume de alimentos ultraprocessados na mesa dos brasileiros mais que dobrou nas últimas quatro décadas, saltando de 10% para 23% do total consumido. A constatação aparece em série de artigos divulgada nesta terça-feira (18) na revista científica Lancet por um grupo de mais de 40 pesquisadores liderado pela Universidade de São Paulo (USP).

Os científicos analisaram dados de 93 países e verificaram que a tendência de alta é praticamente universal. Nos Estados Unidos, os ultraprocessados já ultrapassam 60% da dieta; no Reino Unido, mantêm-se estáveis em torno de 50%. Espanha e Coreia do Sul registraram triplicação do consumo em 30 anos, enquanto a China avançou de 3,5% para 10,4% no mesmo período. Na Argentina, a participação passou de 19% para 29%.

Segundo o epidemiologista Carlos Monteiro, coordenador do Núcleo de Pesquisas em Nutrição e Saúde (Nupens/USP) e líder do estudo, o avanço resulta de estratégias de grandes corporações alimentícias, que “obtêm lucros extraordinários priorizando produtos ultraprocessados”, apoiadas por forte marketing e lobby junto a formuladores de políticas públicas.

Os autores ressaltam que o fenômeno atinge nações de todas as faixas de renda. Países mais ricos começaram em patamares elevados, mas registram crescimento constante; já as economias de renda baixa e média exibem aumentos percentuais ainda maiores. No interior dos países, o padrão repete-se: o consumo inicia nas camadas de maior poder aquisitivo e depois se dissemina.

A publicação sublinha a relação entre o aumento de ultraprocessados e o avanço de doenças crônicas. Revisão de 104 estudos de longo prazo mostrou que 92 deles identificaram maior risco de enfermidades como câncer, problemas cardiovasculares, diabetes tipo 2 e inflamações intestinais em dietas ricas nesses produtos. Os resultados também apontam ingestão calórica excessiva, pior qualidade nutricional e exposição elevada a aditivos químicos.

Para os pesquisadores, a substituição de preparações tradicionais por itens industrializados “é um fator central no crescimento global da carga de doenças ligadas à alimentação”. Embora novas investigações sejam necessárias, eles defendem que a evidência disponível já justifica ações de saúde pública.

Entre as recomendações estão a rotulagem clara de aditivos, gordura, açúcar e sal, restrições de venda em escolas e hospitais e limites rigorosos à publicidade dirigida às crianças. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) brasileiro é citado como referência por definir que, a partir do próximo ano, 90% dos alimentos servidos deverão ser in natura ou minimamente processados.

Outra proposta é aplicar sobretaxas a determinados ultraprocessados para financiar a oferta de alimentos frescos a famílias de baixa renda, além de responsabilizar as empresas pelo impacto de suas estratégias de mercado. De acordo com o estudo, o setor movimenta US$ 1,9 trilhão por ano e utiliza seu poder econômico para expandir produção, influência política e presença global.

Classificados em 2009 por pesquisadores brasileiros, os ultraprocessados são produtos que combinam matérias-primas baratas de origem agrícola com aditivos que prolongam validade e intensificam sabor, como refrigerantes, biscoitos recheados e macarrão instantâneo. A classificação, explica Monteiro, “facilita entender como o processamento afeta a qualidade da dieta” e fundamenta diretrizes como o Guia Alimentar da População Brasileira.

CURTA NOSSA PÁGINA NO FACEBOOK!

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*